O mês de agosto deste ano marcou as comemorações dos 10 anos da sanção da Lei de Cotas, que ampliou o acesso às instituições superiores de ensino. Aprovada pelo Congresso Nacional no ano de 2012, a lei garante reserva de 50% das vagas dos cursos de universidades e centros federais de educação, em todos os turnos. Os beneficiados são alunos provenientes de escolas públicas, com renda inferior ou igual a um salário mínimo e meio por pessoa, e também cidadãos pretos, pardos e indígenas, além de pessoas com deficiência (PCD), incluídas na lei no ano de 2016. 

Para o professor Luiz Augusto Campos, do  Instituto de Estudos Sociais e Políticos e coordenador do Grupo de Estudos Multidisciplinar da Ação Afirmativa da Uerj, a Lei de Cotas trouxe mudanças no âmbito socioeconômico e, principalmente, no debate das desigualdades raciais. 

“Olha, mudou muita coisa! Sobretudo, a diversificação do ensino superior. A gente aumentou substantivamente a quantidade de pretos, pardos e indígenas no ensino superior. A gente diversificou socioeconomicamente também porque os programas de cotas costumam ter recorte de renda e de origem escolar.  E, de um modo mais amplo, acho que mudou bastante a educação da sociedade brasileira em relação a raça né. Então, um efeito da política de cotas que não é um efeito direto, mas indireto, é que ela mudou o debate que se faz sobre desigualdades raciais no Brasil”, explica o professor.

Neste ano de 2022, a Lei de Cotas deve passar por revisões conforme previsto em seu texto, e algumas propostas já estão sendo debatidas. Uma delas, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), pretende aplicar as cotas aos processos seletivos para todos os cursos de graduação das instituições particulares. A ideia é ampliar o ingresso dos alunos nessas instituições que, atualmente, é feito apenas pelo Programa Universidade Para Todos, o Prouni.  Outra proposta em pauta é a inclusão de pessoas trans na lei, usando como referência dados da Associação Nacional de Travestis e Transsexuais. De acordo com a entidade, estima-se que 70% das pessoas trans não concluíram o ensino médio, e que somente 0,02% estejam cursando ensino superior.

O cumprimento efetivo da Lei de Cotas passou a acontecer gradualmente a partir de 2013. Neste mesmo ano, foram reservadas cerca de 33% das vagas aos cotistas.  Ao longo desses dez anos de sanção da lei, foram identificadas melhorias importantes. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE, a presença de pretos e pardos no ensino superior chegou a 50,3%. 

De acordo com Camilly Gomes, mulher, negra e estudante de Serviço Social da UFRJ, as cotas não são esmolas.

Sou a primeira da minha família a entrar em uma universidade pública e foi sim por meio de cota. Eu queria muito fazer faculdade , aqui em casa era sempre incentivada a fazer faculdade.  O sonho até do meu pai era que eu entrasse em uma universidade pública. Realmente foi um sonho dele realizado e pra mim foi maravilhoso também porque eu queria, né! E sabia que não teria condições assim do meu pai dos meus pais pagarem uma faculdade particular pra mim”, disse Camilly. 

Apesar dos avanços, o coordenador do Grupo de Estudos Multidisciplinar da Ação Afirmativa (GEMAA) explica que ainda existem pontos a serem alcançados.

“A gente ainda está longe do momento em que a gente vai poder dispensá-las. A meta da política de cotas não é só colocar mais gente na Universidade, mas é garantir que essas pessoas terminem os seus cursos e se insiram no mercado de trabalho de modo equânime, sem que elas sofram os efeitos da discriminação racial. Se hoje a política de cotas, em um cenário contrafactual fosse cancelada, provavelmente a gente retrocederia muito rapidamente”, afirma o pesquisador.

O professor Luiz Augusto Campos e a aluna Camilly nos revelam que ainda tem muito a ser feito em todas as áreas da sociedade, principalmente, na educação. Mas também expressam que não podemos ignorar os obstáculos vencidos pelas ações afirmativas.

Do Rio de Janeiro para a Rádio Uerj, Lorenna Rocha.