Um auditório lotado para debater e inspirar novos cientistas em todo mundo. Assim foi o Diálogo Nobel Brasil 2024, evento organizado pela Academia Brasileira de Ciências em conjunto com o Nobel Prize Outreach, no dia 15 de abril.

O Teatro Odylo Costa, filho, da Uerj, foi o palco que recebeu três ilustres convidados: Serge Haroche, vencedor do Nobel de Física, em 2012; May-Britt Moser, ganhadora do Nobel de Medicina, em 2014 e David MacMillan, eleito Nobel de Química, em 2021. O evento, em inglês, contou com tradução simultânea.

Em sua terceira edição, a primeira com atividades presenciais, o evento debateu o tema “Criando nosso futuro juntos com a ciência”. A conferência discutiu a importância de uma comunicação efetiva da divulgação científica, e de práticas mais inclusivas para a criação e compartilhamento do saber científico. Serge Haroche começou destacando os desafios para a ciência nesta época em que o negacionismo ganhou espaço.

“Há um paradoxo que, apesar do sucesso da ciência, cada vez mais há uma desconfiança da comunidade científica. Cada vez mais as Fake News das redes socias atacam a ciência, fazendo com que grupos de indivíduos se juntem e ataquem as ideias cientificas.”, disse o nobelista.

A mesa de abertura defendeu o valor da ciência, a inclusão tecnológica, e o seu potencial para transformação socioeconômica. Além disso, apontou a importância da sociedade pensar no despertar científico desde a educação básica, para que a curiosidade e o interesse pela ciência sejam cultivados desde a infância.

O evento ocorreu durante todo o dia, e contou com mesas simultâneas, com a participação de cada um dos nobelistas. Debatendo o papel da universidade na defesa da ciência, Serge Haroche se uniu à reitora da Uerj, Gulnar Azevedo e Silva, e estudantes, em uma conversa que destacou o papel estratégico do fomento à pesquisa nesse processo. Já May-Britt Moser debateu as responsabilidades do cientista com a sociedade, e da necessidade de um ambiente confortável para o trabalho colaborativo. David MacMillan trouxe a necessidade de se discutir um futuro mais sustentável e como a ciência é agente importante para ajudar nesse ambicioso e necessário objetivo.

Para Serge Haroche, também é preciso enxergar a ciência não só como algo útil, mas especialmente como marco civilizatório, ao se apoiar em questões da própria curiosidade da natureza humana sobre o universo, a vida, e outros temas existenciais. Para isso, mais que talento, é necessário ser um verdadeiro explorador.

“Se você puder atraí-los, explicando que essas questões serão respondidas através da ciência, isso vai satisfazer zero a curiosidade deles. Eles entrarão na ciência, talvez mais tarde se interessem em outros tópicos, mas inicialmente vai fisgar a atenção deles”, destacou Serge.

David MacMillan complementa que até mais importante que ser criativo quanto às soluções, é importante estar atento às questões que podem motivar uma pesquisa.

“A cada 10 anos, algo acontece onde eu paro e penso ‘Nossa, que pergunta legal!’, e a palavra ‘legal’… Não sei como eu explico essa palavra ‘legal’, ‘maneira’. Mas eu sei que me toca o coração… ‘Que pergunta maneira, que pergunta legal’! Como é que a gente pode resolver isso? É ai que vai ter o impacto.”, refletiu David.

Além de curiosidade e criatividade, May-Britt Moser encerrou o evento oferecendo uma visão integrada entre conhecimento e colaboração. Para ela, além de ser necessário ter o saber e aplicá-lo de formas distintas, é preciso ter uma visão abrangente da sua área e se unir a pessoas conhecedoras dela, de forma que essa pluralidade possa ajudar tanto na formulação das perguntas a serem feitas, como na colaboração técnica para o desenvolvimento de soluções. Ela trouxe como exemplo o processo de compreensão da Peste Bulbônica na Europa.

“Em tempos secos, de secas, foi quando a Peste Bulbônica aumentou. E aí, uma pessoa, era um biólogo, que colaborou com pessoas que entendiam como o solo funcionava, com historiadores e com meteorologistas, para entender qual era o tipo era o clima no local. Então, quando haviam momentos de estiagem, os ratos morriam e aí os piolhos precisavam de novos hospedeiros, e aí a doença se espalhava, e eu fiquei embasbacada. Nossa! Que coisa interessante essa maneira de pensar.”, comentou May.

Com produção de Eduardo Moncken e colaboração de Guilherme Rezende, do Rio de Janeiro para a Rádio Uerj, Juliana Araujo.