Nos últimos 10 anos a cobertura vacinal no Brasil tem decaído consideravelmente. De acordo com dados do DATASUS, do Ministério da Saúde, as taxas gerais de imunização tem estado abaixo do ideal desde 2012. Essa queda abre as portas para que doenças já controladas voltem a circular. Graças ao Sistema Único de Saúde, o SUS, o Brasil é um dos poucos países que oferecem de maneira gratuita e universal uma grande quantidade de imunobiológicos.  O país é pioneiro na adesão de diversas vacinas no esquema vacinal da população. Mas com a queda da taxa de vacinação, doenças já controladas como sarampo e poliomielite ameaçam reaparecer, e o grupo que corre o maior risco de contaminação são as crianças. O professor titular da faculdade de ciências médicas da Uerj e coordenador da comissão de infecção hospitalar do Hospital Universitário Pedro Ernesto, Marcos Junqueira do Lago, explica os riscos que a população mais pobre corre caso o plano nacional de imunização não esteja em dia.

“As pessoas mais pobres ou menos favorecidas, elas são as que mais se prejudicam quando não tem seu sistema imunização completo. Porque as pessoas mais ricas quando por alguma questão filosófica resolvem não vacinar o filho, isso vai implicar em um risco também, mas proporcionalmente esse risco é menor porque essa pessoa tem condição de procurar um serviço de saúde de boa qualidade rapidamente caso alguma coisa aconteça.”, afirma o professor.

O atual presidente confirmou que a vacinação de crianças será obrigatória para famílias que se inscreverem no Bolsa Família, um dos maiores programas sociais do governo federal.  A obrigatoriedade havia sido retirada pelo último governo como pré-requisito para que as famílias tivessem acesso ao programa. Foi divulgado no final de janeiro deste ano pelo Ministério da Saúde o cronograma do Programa Nacional de Vacinação 2023, e as ações devem começar a partir de 27 de fevereiro. Segundo o professor Marcos, sem o esquema vacinal completo, as crianças são expostas a um risco desnecessário e colocam toda a saúde pública em risco.

“A criança vai se expor a esses riscos individualmente, e tem uma outra consequência maior. Como você fica um tempão com muita gente sem vacina completa você começa abrir as portas da sua casa, eles começam a entrar de novo e aí a gente vai expor todo mundo de novamente ao risco de doenças que estavam controladas.”

A baixa da cobertura vacinal não acontece apenas no Brasil.  Dados da OMS e do UNICEF mostram que nos últimos 30 anos foi registrada a maior queda contínua nas vacinações infantis.  De acordo com as organizações o declínio ocorre por diversos fatores, incluindo um número crescente de crianças que vivem em ambientes de vulnerabilidade.  Além do aumento da desinformação e desafios relacionados à pandemia de covid-19, também são apontados aspectos como a interrupção de serviços, o redirecionamento de recursos para resposta à pandemia e medidas de prevenção que limitaram o acesso e a disponibilidade do serviço de vacinação. De acordo com Mario Roberto Dal Poz, Professor Titular do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e ex-coordenador de Recursos Humanos em Saúde da Organização Mundial de Saúde, as causas para a queda na taxa de imunização são variadas.

“Há problemas de várias naturezas com o sistema de saúde, por exemplo durante um momento aí teve um apagão de informação de registro de vacinação o Ministério da Saúde, o sistema caiu demorou meses para voltar. Além disso a gente teve especialmente durante a pandemia a expansão do movimento negacionista de recusa vacinal, cuja extensão no Brasil era pequena mas que tomou grande proporção na pandemia de covid”. O especialista explica que parte da população tem a percepção errada de que não é preciso se vacinar contra doenças que desapareceram, quando na verdade é graças à imunização que essas doenças se mantiveram controladas.

“Você tem gerações hoje que desde que essas doenças como sarampo foram erradicadas a população não vê, então se ela não vê ela não tem ideia da gravidade dessa doença. Ela precisa ser esclarecida normal, quer dizer, aí não é paternalismo é para oferecer informações que sejam objetivas e que mostrem as consequências da não vacinação e os benefícios da vacinação.”, acrescenta o professor. Uma baixa cobertura vacinal aumenta a chance do retorno de doenças erradicadas, além de contribuir para a circulação de vírus e bactérias que podem deixar sequelas graves ou levar a óbito. A maioria das doenças virais que possuem tratamentos não possuem cura, e a vacinação é a maneira mais segura e eficaz de proteger a saúde.

Do Rio de Janeiro para a Rádio Uerj, Julia Camara.